👩🏽🏫 SOBRE UMA LOUSA INFINITA
por Professora Flávia Mendes
Hoje, me peguei pensando na conjuntura e nos possíveis caminhos para o futuro, pós-pandemia. Pensei muito sobre meu trabalho e o futuro de minha profissão. Ser professor em tempos tão difíceis parece ser um presente, e imagino que isso soe estranho para quem lê, mas, permita-me explicar.
Em janeiro de 2019, conheci um novo formato de estrutura física de espaços escolares. Um projeto mais futurista e talvez até corporativo mesmo. Confesso que estranhei e desconfiei que alguma coisa estivesse fora do lugar. Educação e mundo corporativo, juntos? Como seria isso?
Bem, fui conhecer o tal lugar. Fui de coração aberto, mas com receio de ficar confusa demais e não conseguir compreender a proposta. A cabeça da professora não me deixava esquecer que estava entrando em um prédio escolar. Logo eu, que na licenciatura, uma das coisas que mais me encantou, foi estudar arquitetura escolar. Essa visita foi uma mistura de ansiedade, esperança de ser surpreendida e desconfiança.
Hoje me peguei pensando e lembrando dessa visita. Lembrei-me até do cheiro da tinta fresca, dos bancos escolares novos… me lembro de ter alguém explicando a proposta e os espaços, como ficariam, depois que tudo estivesse pronto. Digo que me lembro, mas me lembro vagamente, porque antes dessa visita guiada, algo mexeu com minha cabeça, confesso que foi meio assim: ”Quando a luz dos olhos meus e a luz dos olhos teus resolvem se encontrar…” Era uma lousa… Uma lousa branca… Uma lousa branca infinita; gosto desse nome: lousa branca infinita. Ela ia do piso ao teto, e o teto parecia ser infinito, porque ela me dava a sensação de infinito. Alguma coisa grande, leve e livre me tocou e me fez ter vontade de abraçar aquela lousa. Estranho, né? Não sei dizer ao certo porque me senti assim, mas sei dizer o que senti naquele momento e o que sinto agora. Naquele momento, me senti tão feliz e livre. Feliz e livre, sim, porque nunca tinha visto tanto espaço e liberdade para escrever sonhos, planos e metas. Para ensinar, do jeito que nós, meus queridos alunos e eu, quiséssemos fazer, explorar esquemas, explorar as famosas “setas” que (dizem) todos os professores de História usam. Sonhei com os filmes e documentários que poderiam ser exibidos ali e discutidos, interpretados, quantos quadros de temas históricos seriam perfeitamente exibidos naquela imensidão, como poderíamos viajar por aquelas livres paredes, livres….
Talvez seja só uma lousa, mas hoje, para mim, representou saudade, representou a ausência do traço e da escrita livre, que reverbera nos corações e mentes de meus tão queridos alunos. Hoje, preparei minhas aulas em uma pequena tela do computador e lembrei que é assim que temos trabalhado e nos reinventado nas últimas semanas, colocando cada gota de amor e de esperança de que a educação une as pessoas em tempos tão duros. Minha profissão virou um presente, porque ainda a tenho, porque ainda posso produzir, ainda posso dividir com o mundo tudo de bom que ele me deu até hoje.
Hoje, aquela lousa ficou, talvez, muito maior do que ela realmente é. Ela cresceu dentro da saudade. Ela cresceu dentro da vontade de voltar lá, de ver meus alunos, meus queridos amigos de trabalho. Ela cresceu na liberdade, que hoje é transformada em pequenos passos de um grato trabalho. Agradeço muito, por tudo, mas agradeço a você, lousa, que me fez lembrar como é bom ser livre.
Obrigada.